terça-feira, 31 de março de 2015

Valor de um mandato

Jamais encontrei alguém - especialista ou protagonista - para explicar de maneira convincente o mistério mais transparente do mundo: por que, na obtenção de um emprego, se gasta mais do que se receberá como remuneração? Para conquistar o cargo de deputado federal é preciso, em tese, investir mais do que se chegará a ganhar legalmente. Qual a lógica disso? A resposta cínica é simples: porque alguém paga a conta. Por exemplo, as empreiteiras. Por que pagam? Porque querem e levam algo em troca. Se for assim, o fundamento da coisa está podre desde sempre. É aceitável que seja essa a base?
Segundo os jornais, com base nas informações oficiais, os gaúchos José Otávio Germano, Jeronimo Goergen e Luís Carlos Heinze gastaram 13,7% da despesa total dos 31 eleitos do Rio Grande do Sul. Investiram, respectivamente, R$2,9 milhões, R$2,7 milhões, R$2,5 milhões. A mídia dos demais eleitos foi R$1,2 milhão. Volto à pergunta inicial: por que alguém gasta R$3 milhões para obter um emprego que não paga oficialmente o suficiente para se recuperar em 48 meses de trabalho metade do investido? Resposta pretensamente sábia: o poder compensa. Como? Irregularmente? Engevix, Grupo Odebrecht, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez financiaram parte das campanhas dos gaúchos citados e presentes na lista de Rodrigo Janot.
Em princípio, tudo regular. Mas é justamente de princípio que se trata: se uma empresa aceita gastar tanto para eleger um deputado é porque espera algo em troca suficiente para compensar o valor que foi gasto e muito mais. O quê? Quando? Em que proporções? O eleito, nesse caso, está desde o começo a serviço de quem pagou a sua conta? Se está, não é representante da população, mas de quem o financiou. Ou devemos acreditar que as empresas, prestadores de serviços ao Estado, ajudam nas campanhas por idealismo e amor à democracia?
Partes interessadas devem sempre se declarar impedidas de participar de processos que possam beneficiá-las e prejudicar terceiros. Na democracia das empreiteiras, vigente no Brasil, as empresas que praticamente só fazem negócios com o Estado financiam a eleição dos que fixarão as regras do jogo. A população é convidada a acreditar que não há problema nisso. Nos EUA, normalmente apresentados como modelo para republiquetas bananeiras como a nossa, isso não é permitido. Por que nesse caso o que é bom para os Estados Unidos não é bom para nós?
Talvez a explicação possa ser mais dinâmica: o que é bom para os deputados pode ser muito bom para as empresas e vice-versa, sendo que o bom para deputados e empresas pode não ser bom para os brasileiros. Um exemplo: precisamos aprovar um Código Florestal que seja bom para o agronegócio e para os deputados que representam o agronegócio. Quem se dispõe a representar esses interesses? "Eu" , "Eu também" , "Aqui, atrás, contem comigo" . Fechado. Quanto vai custar a campanha? Não se incomodem. Recurso não vai faltar. Ao trabalho.

Juremir Machado da Silva, 13/03/2015, Correio do Povo

Sergio Tomaz
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