domingo, 8 de agosto de 2010

A Volta do Curral

Quase todo político sonha com a volta dos currais eleitorais. Nada como ter um dócil rebanho à disposição. É a democracia agropastoril. A candidata Dilma Rousseff declarou que, se eleita, apostará tudo no voto em lista fechada. É a síndrome da mangueira. Quase todo político quer financiamento público e voto em lista fechada. Isso significará, para os donos dos partidos e seus amigos, não ter mais de correr atrás de dinheiro e de votos. A grana sairá dos nossos bolsos e os votos virão no pacote. Bastará colocar uma celebridade qualquer nos primeiros lugares de uma lista para puxar votos para o bando todo. O sistema atual é cheio de defeitos: privilegia os mais ricos e poderosos, aqueles que têm mais acesso aos cofres das empreiteiras e outras empresas de espírito desinteressado, e facilita a eleição de aventureiros. O sistema preconizado por Dilma e por quase todos os partidos tem muito mais defeitos ainda. Pode?
Os poderosos continuarão tendo acesso aos cofres das empresas amigas. Será a consagração do caixa dois privado . Votaremos em fulano e elegeremos mais quatro ou cinco pulhas indigestos. Hoje, em parte, isso já acontece em função do tal quociente eleitoral. Quem faz muitos votos repassa parte deles , depois de atingido o coeficiente para ser eleito, aos companheiros de partido. Vota-se em "a" e elege-se "b" de carona. Um candidato de um partido pode fazer mais votos do que o de outro e ficar de fora. O "novo" sistema é pior. Dá aos partidos o poder total de posicionar os candidatos. A solução é simples demais. por isso, certamente, não é adotada: basta fixar o número de cadeiras e declarar vencedores os indivíduos que fizeram mais votos, em ordem decrescente. Haverá quem se eleja com um milhão de votos e quem se eleja com mil. Isso já acontece atualmente. Em compensação, ninguém passará na frente dos mais votados.
Os políticos mais ardilosos dirão que um candidato eleito com 1 milhão de votos terá mais legitimidade do que um eleito com mil. É o que já acontece. Na prática, depois de eleitos, não interessa o placar. Outro argumento é de que um partido com mais votos, mal distribuídos entre os candidatos, poderá ter menos eleitos do que outro partido com menos votos, o que geraria uma distorção na representação. Conversa. Vivemos em sociedades individualistas e democráticas. Cada cabeça, um voto. Cada voto deve ter o mesmo peso e valer só para quem o recebeu. Os partidos devem ser meros sinalizadores de que as pessoas neles reunidas pensam de maneira semelhante e defendem determinados projetos. Nada que fortaleça demais os partidos pode ser bom no Brasil. Afinal, precisamos evitar a formação de quadrilhas.
Se o sistema em lista fechada for adotado, só haverá uma saída: uma nova revolução de 30. Teremos de ressuscitar Getúlio Vargas e convencer mineiros e paraibanos a nos acompanhar nessa nova aventura. Espero que os paulistas escolham o lado certo desta vez. Ou passarão mais algumas décadas longe do poder. Os revolucionários de 30 lutaram contra a fraude eleitoral, o caciquismo e as manipulações das listas. Há 80 anos.

Juremir Machado da Silva - Jornal Correio do Povo, 02/07/2010

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